TEXTOS

Vamos falar de papel machê?
Papel Machê é a técnica que amplia a imaginação e a criatividade. Além de colaborar com a conservação do meio ambiente pois, diante da carência de recursos naturais e da necessidade de conservação da natureza, os objetos construídos com a massa de papel machê representam uma função importante uma vez que colabora, não apenas com o aproveitamento de detritos, como também, dá uma nova definição para o conceito de lixo.
Material fácil de trabalhar, de baixo custo, com técnicas acessíveis e, aplicando a impermeabilização correta, é também durável.
É uma massa produzida através da maceração do papel. Nesse sentido, podemos fazer uma delimitação do que é papel através da definição de Cedran, (1997. P. 18) que o descreve como sendo uma “pasta de origem vegetal, que, quando necessário, é branqueada, podendo conter cola, carga e corante”. 
Basicamente a confecção de objetos tridimencionais é composta dois processos:

1)   Sobreposição de papel rasgado em tiras e cola. Conhecida como papietagem.  A cola utilizada pode ser caseira feita com farinha de trigo e água ou industrializada a base de metil celulose (CMC) ou poliacetato de vinila (PVA).
2)   Moldagem da massa de papel com adição de cola.

 Esses processos admitem a ocorrência de diversificação das técnicas relativas as fases do processo de produção. Dependendo de variáveis como, aglutinantes, colas, aditivos e outras substâncias ou mesmo mudanças importantes nos métodos e processos de trabalho, para obtenção de graus importantes de dureza, resistência etc.
As técnicas do papel machê e os resultados alcançados foram se ajustando para usos diversos e aplicações decorativas, acessórios de móveis, enfeites em geral, móveis e objetos decorativos, modelos artísticos e didáticos, esculturas, brinquedos, mascaras, entre outras coisas.

HISTÓRICO

         A origem do papel machê ocorre ligado à própria história do papel onde a polpa do papel, impermeabilizado com laca, era utilizado na elaboração de pratos, capacetes, leme de barcos, recipientes para líquidos e muitos outros objetos.
O papel foi inventado na China, no ano 105 d.C. através de experiências com a técnica de maceração para o preparo da polpa, que já era conhecida devido à prática secular chinesa de “bater” o cânhamo para produção do haxixe (CEDRAN, 1997). Partindo de pesquisas com fibras vegetais de cascas de amoreira, rami, cânhamo, bambu, redes de pesca, trapos e pela polpação destes, chegou a produção de uma folha que permitia impressão de registros. Dessa forma, criou-se o primeiro papel da humanidade.

Papel da Dinastia Han - Provavelmente do século I - http://wenzhengwenhua.com/article-3085-1.html

          A invenção do papel foi atribuída a T’Sai Lung, oficial da Corte Imperial Chinesa, o qual foi atribuída a criação do papel – e que “na verdade, apenas apresentou a invenção ao imperador que estimulou sua fabricação” (ROTH, 1983, p. 24).

Este homem(...) imaginou um processo de formação de uma parte de água e fibras vegetais maceradas e desintegradas o mais finamente possível, que despejada em um filtro ou peneira cuja função única é deixar passar a água e segurar as fibras, acabou obtendo sucesso na consecução de seus planos de formação de uma delicada lâmina sobre a qual se pudesse escrever e pintar (FERREIRA, 1983, p.9).
 
Produção do papel de cânhamo. http://wenzhengwenhua.com/article-3084-1.html
O papel foi aplicado largamente, sendo incorporado definitivamente na cultura chinesa. Tendo sido utilizado até mesmo nos funerais chineses com a intenção de manter controle sobre o espírito e as emoções dos participantes. O papel era o material de preparação do corpo, antes, depois do enterro e na cremação para assegurar viagem serena ao espírito do morto (CEDRAN, 1997). 
O mundo oriental era detentor da arte de fabricar papel. Conforme Cedran (1997), do século I a meados do século VII, a técnica de fazer papel era considerada segredo, sendo que, os chineses:

(...) detinham o monopólio e a exclusividade do comércio das folhas fabricadas. A rota comercial de expansão seguiu o mesmo caminho da rota da seda: do Oriente até a Ásia Central, onde era comercializado com povos mais ocidentais, os persar e os assírios (CEDRAN, 1997, p.8).

Até o ano de 751, os chineses conseguiram manter o segredo desta arte dentro de seus limites. Porém, os árabes capturaram alguns chineses papeleiros, conquistando assim, por meio do sequestro, o processo de fabricação conhecido apenas pelo oriente. Em 795, inicia a produção de papel em Bagdá, para, em seguida, ser levado esse conhecimento para o Ocidente, iniciando-se uma rota por Bagdá com destino a Damasco, Trípoli, Cairo, Alexandria, Tunis e, finalmente, chegando à Europa pela espanha, no século XI, em Andaluzia, Cadis, Valência e Sevilha.
Os europeus ajustaram o processo utilizando fibras do linho e de roupas velhas de algodão. No oriente o papel só podia receber escrita de um lado, na Europa, devido diferencial da trama, podia receber escrita nas duas faces do papel.
Na Espanha, onde a fabricação do papel deu início na Europa, sua primeira fábrica foi instalada em Xátiva, Espanha, em 1151. Cem anos depois, a Itália, teve sua primeira fábrica instalada em Fabriano, funcionando até hoje. Em seguida, o papel foi levado para a França, Alemanha, Holanda e Inglaterra; os EUA o conheceram apenas em 1690 (ROTH, 1983, p.36).
O algodão, que era a matéria prima para o papel na Europa, começou a ser substituído somente em 1719, quando o entomologista René de Réaumur observou vespas construindo seus ninhos com uma pasta feita a partir da mastigação de minúsculos pedaços de troncos. Ele comunicou sua descoberta à Academia de Ciências Francesa: sugerindo então que a madeira era matéria prima adequada para a fabricação do papel (EVANGELISTA, 1995). 
No Brasil, as primeiras pesquisas de técnicas de papel e matéria prima foram feitas por Frei Manuel Arruda Câmara, natural da Paraíba, a pedido da coroa portuguesa, em 1799. Tendo estudado plantas que oferecessem qualidades para produzir papel, conseguindo, segundo Cedran (1997, p.13), levantar “oito tipos de plantas, entre elas o linho, o tucum, o barbatimão e o croata-açú”.
Porém, o portugês Moreira de Sá divulga a descoberta do papel de pasta de madeira como sendo um estudo de seu laboratório e resultado de sua fábrica, registrando a conquista num soneto de sua autoria devotado aos príncipes Dom João e Dona Carlota Joaquina impresso em amostra desse papel: “ A química e os desejos trabalharam não debalde, senhor, que o fruto é este / Outras nações a tanto não chegaram.” (BUSS, 1991, p. 05).
A China ao dominar a técnica de fabricação do papel através da pasta de vegetais, criou também, os primeiros objetos de papel machê. Construiram além de objetos de guerra, peças utilizadas em sua cultura e utensilios para o dia-a-dia.
No Ocidente, dominada a técnica de fabricação do papel, passou-se a produção da massa de papel machê.
No século XVI, surgiram na França e Inglaterra, pequenas fábricas artesanais de objetos de papel machê. Os objetos produzidos tinham sua estética baseada nos produtos importados do Oriente.
Caixa de chá, estilo japonês. Provavelmente de 1850. http://www.christies.com/LotFinder/lot_details.aspx?intObjectID=5421654

          Por volta do século XVIII, um famoso encadernador e desenhista tipográfico, John Baskerville, passou a confeccionar objetos com uma nova técnica de fabricação, que atribuía dureza e resistência parecida com madeira; além de resistir ao calor. O processo baseava-se em depositar cola sobre o papel colocando-o em moldes, saturado de óleo de linhaça e secando em altas temperaturas. Ao vencer a patente dessa descoberta, muitas fábricas passaram a produzir e incrementar a técnica confeccionando peças com “acabamento delicado como a porcelana”
(GARCIA, p. 163, 2014).
Na década de 1830 , a Rússia adota o processo inglês de produzir papel machê. Em Fedoskino, próximo a Moscou, a família Lukutin, fabricou caixas, arcas e bandejas. As produções ficaram conhecidas por utilizar a marca de uma águia dupla em uma moldura oval.
Ovos de papel machê Lukutin Séc. XIX - http://www.christies.com/lotfinder/lot_details.aspx?intObjectID=5742407&lid=1&From=salesummery&sid=37971ab0-f242-461f-abf5-2910b65ca2cf

    Em 1851, na Grande Exposição, mobílias criadas com a técnica de modelamento de polpa mor meio de matrizes – Técnica criada por Richard Brindley. Esse foi o período dourado do papel machê, momento em que desenvolveram técnicas de pintura que reproduziam pedras preciosas e mármores; uma técnica de pintura que quase impossível de diferenciar dos originais (MALLALIEU, p. 255, 1999).

Grande Panorama da Grande Exposição de 1851 - Porção do Transept Sul das Notícia ilustrada de Londres . Digitalização de imagem e texto de Philip V. Allingham

Atualmente no Brasil, o uso do papel machê faz parte da confecção de fantasias e carros alegóricos dos carnavais bem como, na produção de bonecos gigantes do Estado de Pernambuco. É igualmente utilizado na fabricação de fantoches e mamulengos (tipo de fantoche largamente utilizado no nordeste brasileiro). É também um material de grande uso nas escolas, pela facilidade do uso e o baixo custo.
As troças do carnaval de Olinda com seus triunfantes bonecos gigantes, feitos a partir do papel machê, com nomes e caracterizações pitorescas.
A linda representação do folclore brasileiro, o Bumba meu Boi. Presente em todo país, com ritmos, nomes personagens, formas diversas de representação, próprios de cada região. Em Santa Catarina o Boi de Mamão com o Bernúnça (“dragão do mal”), a cabra e a Maricota que é uma mulher muita alta que rodopia e balança os braços, atingindo intencionalmente o público. Já no Amazonas e Pará, Boi-Bumba ou Pavulagem. Em Pernambuco, o Boi Calemba ou Bumbá. No Ceará é Boi de Reis, Srubim e Boi Zumbi. Na Bahia é Boi Janeiro ou Boi Estrela-domar, Dromedário ou ainda, Mulinha de Ouro. No Paraná e Santa Catarina é Boi de Mourão ou Boi de Mamão. Em Minas Gerais e Rio de Janeiro, é Bumbá ou Folguedo de Boi. E por aí vai! O uso do papel machê na retratando a cultura do Brasil!
https://festasnobrasil.catracalivre.com.br/as-festas/nacional/folclore-em-cores-e-alegria-bumba-meu-boi/

ALGUNS ARTISTAS

DOMINGOS TÓTORA¹

 

Nascido e criado em Maria da Fé, uma cidade na região montanhosa de Minas Gerais, Domingos Tótora retornou à sua cidade natal depois de estudar design em São Paulo e escolheu o papelão como material fonte para seu trabalho que se situa entre arte e design. A paisagem circundante e sua paixão pela natureza servem como fontes de inspiração para seu trabalho. Começando com papelão reciclado, ele cria objetos e esculturas onde a beleza é inseparável da função, concedendo uma aura artística aos objetos comuns do cotidiano.

Tótora também se utiliza da mistura de materiais como fibra de bananeira e para confeccionar pratos, mesas, bancos e vasos com beleza única.

 


MAURO DRUMMOND²

O artista nasceu em Belo Horizonte (1949) onde vive até hoje. Seu trabalho é a mistura da massa do papel com a terra.
A linha Terra da MD OBJETARIA, são produzidos com uma massa de papel (papel maché) e a mistura das cores terra. O minério denotam a sua origem. As formas apropriam na história da trajetória do homem. A marca do fogo na sua queima revela o ofício guardado no tempo. O objeto construído encanta pelo processo e significado da sua experiência.



DAN REEDER³

É um artista de sessenta e sete anos de idade, vive em Seattle, Washingmachine. É conhecido como Homem Monstro devido aos dragões de papel machê que produz. Fez seu primeiro dragão aos vinte e dois anos.  
O diferencial da sua arte é o uso de tecidos em seu trabalho o qual ele chama de tecido machê.



JOÃO PAULO RAIMUNDO4

João Paulo Raimundo, nascido em Maria da Fé-MG, designer autodidata, resgatou a técnica milenar do papel machê para fazer o papelão voltar à sua origem.  Criando móveis, esculturas e peças de decoração que recebem um fino acabamento, Raimundo produz peças resistentes e com aparência de madeira ou ferro. Há quatro anos expõe as obras em seu showroom em Santo Antônio do Pinhal, a cidade que, segundo João, é rica em inspiração.


JULIANA BOLLINI5


Juliana Bollini é uma Artista Visual nascida na Argentina, Buenos Aires, atualmente, vivendo em São Paulo. E, como a artista se autodenomina, sucateira.

"Trabalho com papéis de diferentes tipos, re-aproveito muito material, de embalagens principalmente. Também uso arame para as estruturas, e sucatas, como pedaços de madeiras para bases ou alguma junção."


¹ Texto e imagens extraídos do site do artista.
² Texto e imagens extraídos do site do artista.
³ Informações e imagens extraídas do site do artista. https://gourmetpapermache.com/
5 Texto e imagens extraídos do site do artista. http://julianabollini.blogspot.com.br/search?updated-max=2009-01-27T03:58:00-08:00%3D500 e http://projetocuradoria.com/juliana-bollini/


MASSA BÁSICA DE PAPEL MACHÊ

Materiais Necessários

·         Papel (folhas de jornal, papel kraft, folhas de caderno ou papel higiênico limpo)
·         Cola branca
·         Água
·         Recipiente para misturar a massa

Passo a Passo

1. Rasgue o jornal em pedaços pequenos e coloque-os num recipiente.
2. Despeje água morna dentro da vasilha contendo o papel. Deixe o papel amolecendo por 10 a 12 horas, no mínimo.
3. Coloque a massa em um pano e esprema para retirar toda a água.
4. Adicione cola branca aos poucos e vá trabalhando a massa com as mãos.
5. Quando a massa ganhar liga, estará pronta para ser modelada.

SECAGEM: O processo de secagem leva em média 4 dias, dependendo da úmidade do ar, para que a peça fique seca totalmente. É preciso ficar em lugar arejado ou em uma estufa. Após a secagem total o objeto pode ser levado ao forno quente tomando cuidado para que não queime. Quando a peça estiver seca, retirar as rebarbas primeiro com uma lixa grossa e, em seguida, com lixa fina. A pintura pode ser feita com tinta acrílica ou PVA.


BIBLIOGRAFIA

CEDRAN, Lourdes. Cartilha do papel artesanal. São Paulo: Páginas e Letras, 1997.

FALEIRO, Angelita. Desbravando nosso folclore. São Paulo: Biblioteca 24 horas. 2010.

FERREIRA, José Herculano. Materiais Populares na Educação Artística. Belo Horizonte: Imprensa Oficial. Belo Horizonte, 1983.

MALLALIEU, Huon. História ilustrada das antiguidades. São Paulo: Nobel, 1999.


MARCONDES, Luiz Fernando. Dicionário de Termos Artísticos. Rio de Janeiro:  Edições Pinakotheke, 1998.
 
ROTH, Otávio. O que é papel. São Paulo: Brasiliense, 1983. Coleção Primeiros Passos.


ARTIGOS


LES MODELES D’ANATOMIE CLASTIQUE DU DOCTEUR AUZOUX AU MUSEE DE L’ECOLE VETERINAIRE D’ALFORT par Guillaume Ruiz - et Christophe Degueurc- * Bull.Soc.Hist.Méd. Sci.Vét., 2009, 9: p.35-49. Disponível em,

BUSS, Diva Elena. Como fazer papel artesanal. São Paulo, 1991. Parte prática da dissertação de mestrado “ Papel artesanal: Veículo criativo na arte e na sociedade, defendida na escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, em 16 de maio de 1991. Disponível em 

EVANGELISTA, Maria do Socorro Oliveira. Reciclagem artesanal: os papéis do papel. Monografia apresentada à Coordenação do I curso de Especialização em Ensino de Arte – Departamento de Artes/UFRN. Orientador: Vicente Vitoriano Marques Carvalho. Natal: UFRN, 1995. Disponível em, 

GARCÍA ADÁN, Pedro (2014). “El papel maché y la forma tridimensional”. Em Modelos y maquetas: la vida a escala. Madrid: Ministerio de Educación, Cultura y Deporte de España. 160–169. Disponível em

MENEZES, Robson Cardoso de. O mercado, a comercialização e a industrialização dos resíduos recicláveis da Região da Grande Florianópolis. Florianópolis : UFSC, 1994. p. 12-14. (Monografia). Disponível em

Plantas de papier-mâché . Estudios técnicos y conservación de  la  colección  Brendel  del  Colegio  Nacional  de  Buenos Aires. Argentina
Conselho Nacional de Pesquisa Científica e Técnica (CONICET). Arquivo Histórico do Museu de La Plata, FCNyM, Universidade de La Plata. Argentina. 2016. María Gabriela MayonI. Disponível em, 
http://www.academia.edu/26923710/Plantas_de_papier-m%C3%A2ch%C3%A9._Estudios_t%C3%A9cnicos_y_conservaci%C3%B3n_de_la_colecci%C3%B3n_Brendel_del_Colegio_Nacional_de_Buenos_Aires._Argentina



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